A possível influência da fonte proteica da dieta e o risco de câncer de mama tem criado considerável atenção na comunidade científica. Alta ingestão de proteína pode afetar o risco de câncer de mama por aumentar o fator de crescimento semelhante a insulina-1 (IGF-1), que desempenha papel importante no crescimento celular e na progressão tumoral. Hoje, sabe-se que os alimentos que são as principais fontes de proteína diferem nos seus perfis de nutrientes e podem ter diferentes efeitos no risco de câncer de mama. No entanto, muitos dos estudos que não encontraram associação entre o consumo de carne vermelha e o risco de câncer de mama avaliaram a dieta na meia idade e após.
O “Estudo das Enfermeiras de Harvard II” é um coorte prospectivo que começou em 1991 com seguimento de 20 anos, contou com 88.803 participantes com idades entre 24 a 43 anos. As participantes completaram um questionário alimentar com 130 itens em 1991, 1995, 1999, 2003 e 2007. Em uma primeira análise deste estudo com 12 anos de seguimento, ficou demonstrado que o consumo de carne vermelha durante o início da idade adulta aumentou o risco de câncer de mama na pré-menopausa, especialmente para tumores com receptores hormonais positivos.
Muitas linhas de evidência sugerem que exposição a fatores carcinogênicos, incluindo os fatores dietéticos, entre a menarca (primeira menstruação) e a primeira gravidez, podem ter efeitos mais importante no desenvolvimento de câncer de mama. Estudos epidemiológicos com mulheres que sobreviveram a bomba atômica em Hiroshima e Nagasaki e o tratamento de radioterapia para o linfoma de Hodgkin demonstraram que a exposição à radiação na infância e início da idade adulta foi associada ao subseqüente risco de câncer de mama, mas foi menos relacionada entre mulheres com mais de 30 anos no momento da exposição.
Nesta análise atualizada com maior tempo de seguimento e aproximadamente três vezes o número de casos de câncer de mama, os pesquisadores investigaram a associação da ingestão total de carne vermelha, não processada e processada, antes da menopausa com o risco de câncer de mama no geral e separadamente entre mulheres na pré e pós-menopausa. Além disso, examinaram as associações entre o câncer de mama e outros alimentos ricos em proteínas, incluindo aves, peixes, ovos, leguminosas e nozes e castanhas.
Foram documentados 2.830 casos de câncer de mama e, em uma análise multivariada, o risco foi 22% maior para as mulheres que consumiam a maior quantidade de carne vermelha quando comparadas com as que comiam a menor quantidade, RR 1,22 para o maior quintil versus o menor quintil. Mais ainda, para cada porção extra de carne vermelha ao dia houve um aumento de 13% no risco entre todas as mulheres, 12% de aumento no risco entre as mulheres na pré-menopausa e 8% maior risco na pós-menopausa.
Ao se estimar os efeitos da troca de diferentes fontes protéicas, a substituição de uma porção/dia de carne vermelha por uma porção/dia de leguminosas foi associada a um risco 15% menor de câncer de mama entre todas as mulheres e 19% menor entre mulheres na pré-menopausa. Levando em conta o status menopausal, a substituição de carne vermelha por carne de aves mostrou diminuir o risco de câncer de mama na pós-menopausa (24% menor), mas não teve influência na pré-menopausa e o consumo de aves não foi associado com menor risco em outros estudos prospectivos. Não foi observada uma associação clara entre consumo de peixe e risco de câncer de mama.
Também observou-se que a associação entre carne vermelha e câncer de mama foi modificada pelo uso de anticoncepcionais orais. Para cada porção ao dia de carne vermelha, o risco de câncer de mama foi 54% maior entre as mulheres em uso de pílula anticoncepcional e 11% maior para as ex-usuárias de anticoncepcional.
Alguns dos mecanismos que podem explicar a associação positiva entre consumo de carne vermelha e risco de câncer de mama:
- Subprodutos carcinogênicos como aminas heterocíclicas e hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, criados durante o cozimento da carne em altas temperaturas;
- Gordura animal e ferro heme da carne vermelha;
- Resíduos de hormônios exógenos para estimular o crescimento do gado.
Os pesquisadores encontraram que, no geral, o risco foi menor em mulheres que substituíram a carne vermelha por legumes (feijões, lentilhas, tofu, ervilhas) durante o início da idade adulta. Legumes contem vários componentes como fibras e fitoestrogênios, os quais tem sido negativamente associados a incidência de câncer de mama e efeitos anticarcinogênicos dos feijões tem sido demonstrados em modelos animais. Um estudo intervencionista demonstrou que substituir uma dieta rica em gordura e proteína animal por uma rica em gordura e proteína vegetal pode reduzir os níveis plasmáticos de estrógeno em mais de 40%.
Mecanismos que podem explicar a associação inversa entre leguminosas e risco de câncer de mama:
- Redução nos níveis de insulina,
- Redução no fator de crescimento semelhante à insulina (IGF-1),
- Redução nos biomarcadores inflamatórios,
- Alterações no metabolismo dos lipídeos.
Este estudo apoia a associação entre alto consumo de carne vermelha na adolescência e início da idade adulta e risco de câncer de mama e que não foi claramente restrita aos casos na pré-menopausa, não se podendo dizer com confiança que não exista associação na pós-menopausa. No presente estudo, o risco de câncer de mama foi 22% maior para as mulheres que consumiam carne vermelha 1,5 vezes ao dia quando comparadas com as que comiam uma vez por semana e cada aumento de uma porção ao dia de carne vermelha foi associado a um aumento de 13% no risco de câncer de mama. O risco ainda aumenta em 54% para cada porção diária adicional de carne vermelha entre as mulheres que tomam pílula anticoncepcional.
Fonte: http://www.bmj.com/content/bmj/348/bmj.g3437.full.pdf