O risco de diabetes tipo 2 está fortemente ligado à obesidade. As taxas de diabetes atingiram proporções epidêmicas de acordo com a OMS, refletindo o rápido aumento da prevalência da obesidade em todo o mundo. É de se esperar que, devido ao seu IMC relativamente baixo, vegetarianos ocidentais tenham um menor risco de diabetes quando comparados aos não-vegetarianos.
Usando dados da coorte do estudo Adventist Health Study-2 (AHS-2), pesquisadores demonstraram um menor risco de diabetes em semi-vegetarianos, lacto-ovo-vegetarianos e veganos em comparação com não-vegetarianos, sendo o risco para os vegetarianos a metade do risco dos não vegetarianos em geral, após ajuste para IMC.
Tomados em conjunto com estudos realizados em populações não-vegetarianas [1], evidências convincentes sugerem que a ingestão de carne é um fator de risco dietético para o diabetes. Em uma recente revisão sistemática e metanálise, o consumo de carne vermelha (risco relativo [RR] 1,21, intervalo de confiança de 95% [IC] 1,07-1,38) e carne processada (RR 1,41; IC 95% 1,25-1,60) foi associado a um aumento no risco de diabetes tipo 2 [2]. Subgrupos de carne, como hambúrguer, bacon e cachorros-quentes, foram especificamente associados a um risco aumentado [2]. Os mecanismos sugeridos incluem componentes de carne como gordura saturada, ferro heme, bem como nitritos e nitratos encontrados em carnes processadas.
No estudo “AHS-2” da Universidade Loma Linda, foi examinada a relação entre as dietas vegetarianas e ambas prevalência e incidência de diabetes mellitus tipo 2. Os participantes foram agrupados como vegan, lacto-ovo-vegetariano, pesco-vegetariano, semi-vegetariano ou não-vegetariano (grupo de referência). A prevalência de diabetes tipo 2 foi de 2,9% entre os vegans, 3,2% entre os ovo-lacto-vegetarianos, 4,8% entre os pesco-vegetarianos, 6,1% entre os semi-vegetarianos e 7,6% entre os não vegetarianos. Na análise estatística, comparados com os não-vegetarianos, ajustando as variáveis (para idade, sexo, etnia, escolaridade, renda, atividade física, observação de televisão, hábitos de sono, consumo de álcool e IMC) os RRs para prevalência de diabetes tipo 2 foram de 0,51 (95% IC 0,40; 0,66) para os veganos, 0,54 (IC 95%: 0,49; 0,60) para os ovo-lacto-vegetarianos, 0,70 (IC95%: 0,61; 0,80) para pesco-vegetarianos, e 0,76 (IC95%: 0,65; 0,90) para os semi-vegetarianos.
Entre os 41.387 participantes que não relataram ter diabetes mellitus no início do estudo, um questionário de seguimento após dois anos obteve informações sobre o desenvolvimento do diabetes. Os casos de diabetes desenvolveram-se em 0,54% dos veganos, 1,08% dos lacto-ovo vegetarianos, 1,29% dos pesco vegetarianos, 0,92% dos semi-vegetarianos e 2,12% dos não vegetarianos. Quase 4 vezes menor incidência de diabetes em veganos comparados com os não-vegetarianos. Os negros tiveram um risco aumentado em comparação com os não-negros (odds ratio [RR] 1,364, intervalo de confiança de 95% [IC], 1,09-1,70). Na análise estatística, controlando a idade, gênero, educação, renda, observação de televisão, atividade física, sono, consumo de álcool, tabagismo e IMC, os veganos (RR 0,38; IC 95% 0,23-0,61), lacto-ovo-vegetarianos (RR 0,61; 95% IC 0,50-0,76) e semi-vegetarianos (RR 0,48, IC 95% 0,31-0,75) tiveram um menor risco de diabetes do que os não-vegetarianos, sendo 62% menor risco para os veganos. Em indivíduos não-negros, as dietas veganas (RR 0,42, IC 95% 0,24-0,74); lacto-ovo (RR 0,68, IC 95% 0,54-0,86); e semi-vegetarianas (RR 0,50, IC95% 0,30-0,82) foram protetoras contra a diabetes. Porém, entre os negros somente as dietas veganas (RR 0,30, IC 95% 0,11-0,84), e lacto-ovo-vegetarianas foram protetoras (RR 0,47, IC 95% 0,27-0,82), tendo a dieta vegana uma redução no risco de 70% para esta população. Estas associações foram reforçadas quando o IMC foi removido das análises.
O principal achado deste estudo foi que as dietas veganas, ovo-lacto-vegetarianas e semi-vegetarianas foram associadas a uma redução substancial no risco de diabetes comparadas com as dietas não-vegetarianas, após ajuste para IMC e fatores socio-demográficos e de estilo de vida. Entre os participantes não-negros, as dietas vegana, ovo-lacto e semi-vegetariana foram associadas a um menor risco de diabetes, enquanto entre os participantes negros, apenas as dietas veganas e ovo-lacto-vegetarianas foram associadas a um menor risco de diabetes. O aumento no risco de diabetes no subgrupo de etnia negra foi da ordem de um terço, enquanto a proteção proporcionada pelas dietas veganas neste subgrupo foi de 70% e pela dieta ovo-lacto-vegetariana de 50% sugerindo que o tipo de dieta vegetariana pode ser uma forma de neutralizar o aumento do risco de diabetes para os negros (Fig. 1)
Parte da proteção associada com dietas vegetarianas é devido ao menor IMC de vegetarianos em comparação com não-vegetarianos, no entanto, as associações continuaram fortes após ajustar para o IMC. Além disso, mecanismos plausíveis têm sido propostos para explicar a proteção associada com dietas vegetarianas. Frutas e vegetais podem contribuir para uma diminuição da incidência de diabetes tipo 2 através da sua baixa densidade energética, baixa carga glicêmica e alto teor de fibra e macronutrientes. Outras características da dieta vegetariana são grãos integrais e leguminosas. Estes alimentos foram mostrados em melhorar o controle glicêmico, diminuir a taxa de absorção de carboidratos e o risco de diabetes [3,4].
Uma dieta que incluía peixes não foi associada a uma redução significativa do risco e pelo menos dois estudos prospectivos têm mostrado um aumento no risco de diabetes associado com consumo de ácidos graxos de cadeia longa ômega-3 ou consumo total de peixe [5,6]. Uma explicação pode ser pelos elevados níveis plasmáticos de selênio associados com a ingestão de peixes, que têm sido relacionados com o risco de diabetes. Mais pesquisas são necessárias para entender os mecanismos pelos quais o selênio está implicado no risco de diabetes.
Os dados do Estudo Adventista são concordantes com os achados de outro estudo muito semelhante conduzido com 4.384 adultos budistas de Taiwan que também mostrou uma prevalência 3 vezes menor de mulheres diabéticas entre as vegetarianas comparadas com as onívoras e metade da prevalência em homens. Neste estudo o risco de desenvolver diabetes caiu mais da metade em homens e ate 75% em mulheres vegetarianas [7].
Como conclusão dietas vegetarianas e veganas foram associadas a uma substancial e independente menor incidência de diabetes entre participantes negros e não-negros, indicando o potencial destas dietas para conter a atual epidemia de diabetes.
fontes:
Vegetarian diets and incidence of diabetes in the Adventist Health Study-2
1. Song Y, Manson JE, Buring JE, Liu SL. A prospective study of red meat consumption and type 2 diabetes in middle-aged and elderly women. Diabetes Care. 2004; 27:2108–15. [PubMed: 15333470]
2. Aune D, Ursin G, Veierod MB. Meat consumption and the risk of type 2 diabetes: a systematic review and meta-analysis of cohort studies. Diabetologia. 2009; 52:2277–87. [PubMed: 19662376]
3. Jenkins DJA, Kendall CWC, Marchie A, Jenkins AL, Augustin LSA, Ludwig DS, et al. Type 2 diabetes and the vegetarian diet. Am J Clin Nutr. 2003; 78(Suppl):610S–6S. [PubMed: 12936955]
4. de Munter JSL, Hu FB, Spiegelman D, Franz M, van Dam RB. Whole grain, bran, and germ intake and risk of type 2 diabetes: a prospective cohort study and systematic review. PLoS Med. 2007; 4:1385–94.
5. Kaushik M, Mozaffarian D, Spiegelman D, Manson JE, Willett WC, Hu FB. Long-chain omega-3 fatty acids, fish intake, and the risk of type 2 diabetes mellitus. Am J Clin Nutr. 2009; 90:613–20. [PubMed: 19625683]
6. van Woudenbergh GJ, van Ballegooijen AJ, Kuijsten A, Sijbrands EJ, van Rooij FJ, Geleijnse JM, et al. Eating fish and risk of type 2 diabetes: a population-based, prospective follow-up study. Diabetes Care. 2009; 32:2021–6. [PubMed: 19675200]
7. Taiwanese Vegetarians and Omnivores: Dietary Composition, Prevalence of Diabetes and IFG